segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Fim de mim

Fim de mim

Busquei numa procura sem fim
Por volta só jardins floridos
O meu pedaço de mau caminho
Não seria nada sem mim

Matei as flores do jardim
Pude enfim perceber
A praga que o matava
Era alimentada por mim

Desejei belezas infinitas
Fiz assim pra mal dizer
Aproveitei apenas as findas
Cada vez mais distante de mim

Cessei a busca por um instante
Passei a olhar para dentro
Aquilo que eu procurava
Estava o tempo todo em mim

Pedro Junqueira Franco de Castro 15:03 20/11/2016

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Deus me guarde em vida

Deus me guarde em vida

Deus que me livre
Viver para enriquecer
Sustentar um status
Dispensar o amor
Acumular matéria sem vida

Deus que me livre
Viver só de ser feliz
Sustentar um sorriso
Dispensar a lágrima
Acumular essa mágoa em vida

Deus que me livre
Viver essa miséria
Sustentar esse mártir
Dispensar a alegria
Acumular a desilusão na vida

Deus que me guarde
Trabalho para enobrecer
Leveza para me sustentar
As horas com alegria passar
Sabedoria na vida acumular

Pedro Junqueira Franco de Castro 29/09/2015 17:33

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

A dor da gente não sai no jornal

A dor da gente não sai no jornal

Parecia mais uma noite normal para Joana, nordestina que morava em um humilde barraco da favela de Paraisópolis na capital Paulista e trabalhava de faxineira em um prédio de negócios próximo à Avenida Paulista. Ela tomava o seu café requentado com um pouco de leite e assistia a um filme brasileiro que passava na sua televisão de LED, seu único luxo do qual ainda pagava as parcelas. O filme era baseado no romance de uma escritora brasileira, mas isso pouco importava para ela já que mal sabia ler. Ela havia gostado mesmo era da personagem principal, Macabéa, que tinha uma história muito parecida com a sua.
Foi nesse momento de distração que seu mundo começou a ruir, Joana recebeu uma mensagem de celular do seu namorado, João, dizendo que ele havia se apaixonado por outra mulher e queria terminar o relacionamento. Aquela mensagem fez o único castelo de areia que ainda restava para Joana desmoronar, afinal o namorado era a única pessoa que parecia se importar com ela no mundo. No trabalho ninguém notava sua presença, não recebia um bom dia sequer, sua família havia voltado para o Nordeste e a única amiga que acreditava ter era na verdade uma voz eletrônica de um desses disk amizades para o qual ela ligava nos momentos de solidão.
Joana estava inconformada com a mensagem, ele não havia se dado o trabalho de falar aquilo pessoalmente e não deu sequer uma justificativa. Sentindo-se ainda mais triste e sozinha, ela voltou sua atenção para o filme e tentou esquecer tudo aquilo. Foi do enredo do filme que tirou uma ideia para chamar a atenção de alguém e se sentir importante. A Macabéa, com a qual tinha tantas semelhanças, tinha tido o momento mais importante da sua vida na sua morte, foi atropelada por uma Mercedez e virou pelo menos por alguns segundos o centro da atenção de todos na rua. A faxineira decidiu então que o melhor a se fazer era tirar a própria vida, ela acreditava que assim iria ser manchete dos jornais, teria seus 15 minutos de fama e morreria tendo a atenção de alguém.
Ela pegou todos os comprimidos que tinha no armário e tomou todos de uma só vez. Aos poucos começou a ter uma forte intoxicação, sentiu um enjoo imenso e entrou em desespero. O desespero aumentou ainda quando pegou o celular, viu uma mensagem do namorado perguntando se estava tudo bem e desejando boa noite. Joana não havia reparado, mas a mensagem que havia recebido antes era de um outro número, na certa uma triste coincidência, ela havia errado de João. Com o corpo já tomado pela intoxicação, ela não teve forças para responder a mensagem pedindo socorro e a única coisa que conseguiu fazer foi abrir a porta do barracão desmaiando logo na entrada.
A sua sorte foi que o caminhão de lixo passava naquele dia, um dos lixeiros a viu deitada quase sem vida e chamou por socorro. A ambulância demorou a chegar, mas ainda conseguiu resgatar Joana com alguns sinais de vida até o hospital mais próximo. Chegando lá passou por uma lavagem intestinal, recebeu soro na veia para desintoxicação e ficou acamada até acordar. Durante o tempo em que passou desacordada sonhou com seu trabalho, mas algo estava diferente, os chãos do escritório estavam imundos, os papéis vazavam pela lixeira sem ser recolhidos e todos gritavam freneticamente exigindo café. Um verdadeiro caos havia tomado conta do escritório e não havia nada que ela poderia fazer.
Joana acordou meio tonta, sem entender onde estava e ainda com uma forte dor de barriga. Só foi se lembrar da noite anterior quando o médico entrou na sala e percebeu que estava em um hospital.
- Bom dia, Joana - disse o doutor com um tom sério - você ainda deve estar meio confusa por conta da grande quantidade de remédios que ingeriu, mas logo vai estar melhor e vai poder voltar pra casa.
- Peço desculpa pelo incômodo doutor - disse a faxineira sem esconder a vergonha na cara - mas preciso ir embora logo, tenho que ir trabalhar se não perco meu emprego.
- Fique tranquila, Joana, vou te dar um atestado de dois dias, você precisa de descanso.
Apesar de estar muito envergonhada com a situação, Joana ficou feliz pelos dias de descanso e pela maneira atenciosa com que foi atendida pelo médico. Ela sabia como era difícil ter um bom atendimento nos hospitais públicos. Depois de medicada, a faxineira retirou-se para o seu lar. Chegando em casa foi correndo pegar o celular, havia recebido várias ligações e mensagens do namorado. Não pensou duas vezes, ligou correndo e mesmo com vergonha, explicou tudo para o João. Ele foi compreensivo e a partir daquele dia passou a demonstrar mais o carinho que sentia por ela.
Joana teve a ideia de procurar nos jornais e ver se algum deles havia noticiado a sua tentativa de suicídio. Correu até a banca mais próxima e comprou os principais jornais que cobriam a região em que morava. Para o seu espanto e alegria nenhum deles havia publicado o ocorrido, apesar de não conseguir ler nenhuma notícia completa por conta de sua dificuldade de leitura, ela ficou impressionada com a linguagem dos jornais. A maioria deles expunha tragédias e acontecimentos tristes na vida das pessoas, mas nenhum deles falava sobre o sentimento dessas pessoas e não pareciam estar preocupados com a dor que os familiares iriam sentir ao ler a notícia de uma morte por exemplo. Foi então que ela percebeu que a dor da gente não sai no jornal.
Ciente que sua história não havia virado manchete, ela descansou durante o resto do dia e tirou o outro dia para fazer coisas que gostava. Se deu até ao luxo de ir ao cinema com o namorado. Ligou para o trabalho avisando que estava com uma infecção intestinal, pediu desculpas para o patrão pela ausência sem aviso prévio e disse que voltaria no outro dia. Ele compreendeu, pediu para que ela levasse o atestado no dia seguinte e desejou melhoras para Joana.
Acordou cheia de disposição no dia seguinte, chegou no seu trabalho e percebeu que teria muito trabalho a fazer, afinal ninguém tinha feito o seu trabalho durante a sua ausência e a sujeira estava acumulada pelos quatro cantos do escritório. Porém o que mais chamou sua atenção foi que o chefe do departamento pessoal, que era conhecido por ser o mais sem educação e estressado da empresa chegou para ela e perguntou assim que chegou.
- Bom dia, Joana. Fiquei sabendo que esteve ausente, o que houve?
- Bom dia, doutor - apesar de saber que nenhum funcionário ali era doutor, Joana chamava todos de doutor, havia aprendido com seus pais que chamar os outros de doutor era sinal de respeito - tive um pequeno problema de saúde, mas já estou melhor, obrigada.
- Que bom, Joana. Depois passe por gentileza na minha sala, tem muito lixo acumulado e senti falta daquele cafezinho que só você sabe fazer.
- É pra já, doutor.
Joana abriu um sorriso sincero como nunca havia sorrido na vida. Foi então que teve um breve pensamento, a tristeza existe para todos, mas não é colocando-a em uma manchete que vamos conseguir acabar com ela. O melhor a se fazer é trabalhar com alegria, focar nas coisas boas que podemos fazer as pessoas e procurar ver sempre o lado bom da vida. O pequeno incidente fez ela perceber o quanto o seu trabalho era importante na vida das pessoas, mesmo ninguém lhe dando a atenção merecida, ela sabia agora que a sua ausência era sentida. E não demorou muito para o seu serviço ser reconhecido, depois que passou a trabalhar com seriedade e bom humor, foi promovida a chefe do setor de limpeza do prédio em que trabalhava e com o dinheiro que ganhava a mais passou a planejar seu casamento com o João.

domingo, 18 de setembro de 2016

A lenda do menino macaco

A lenda do menino macaco

Era uma tarde ensolarada na aldeia Aracoara, localizada não muito longe da costa brasileira e os indiozinhos brincavam próximo a cachoeira, quando um deles, o Kayapó, percebeu um movimento estranho entre as árvores. Intrigado como todo criança fica quando vê algo diferente, ele chegou mais perto e se deparou com um macaco comendo algumas frutas. O menino ficou encantado, aquele macaco não se parecia com nenhum que ele já tinha visto na região, era forte e tinha a pelagem das mãos ruivas. O macaco despertou o interesse do pequeno índio, ele queria ter os pelos ruivos como os da mão do macaco, queria ser diferente do resto da tribo, não gostava de se parecer igual a todo mundo.
Kayapó se lembrou ter ouvido o pajé da tribo uma vez falar que ao comer a carne do animal, nos tornamos um pouco ele e ficamos com algumas das suas características. Então, mesmo sabendo que os índios pequenos não tinham permissão para caçar em sua tribo, ele pegou o arco e flecha escondido do seu pai e entrou na mata a procura do macaco de mãos ruivas.
Não demorou muito tempo para Kayapó reencontrar o macaco, ele estava próximo do local onde ele o viu anteriormente, só que agora descansava no tronco de uma árvore. O pequeno índio logo pensou que estava com sorte, como o macaco dormia seria uma presa fácil, ainda que ele não sabia direito mirar as flechas. Ele acertou o macaco de primeira, que caiu no chão se contorcendo e dando berros de dor.
Assustado, o pequeno índio esperou até o macaco parar de berrar e depois foi levar o macaco orgulhoso para os pais. Kayapó foi correndo orgulhoso mostrar o resultado da caçada para a tribo. Porém chegando lá teve uma surpresa não muito boa, seu pai o esperava na oca com a cara fechada. E não demorou muito para bronca do pai vir.
- Kayapó estou muito bravo com você, não pude ir caçar hoje com o resto da tribo, pois não encontrei meu arco e flecha - disse o pai em tom severo - sabia que era você tinha pego, me dê isso aqui agora.
- Me desculpe pai - disse o menino de cabeça baixa - eu queria caçar esse macaco, quero ter a pelagem ruiva como ele.
- Que grande besteira Kayapó, você não vai ter a pelagem ruiva por caçar o macaco - continuou o pai ainda em tom severo - além disso, você sabe muito bem que crianças como você não tem permissão para caçar, a caça é uma tarefa apenas dos mais velhos.
O garoto devolveu os instrumentos de caça para o pai junto com o macaco, inconformado por não ter recebido nem um parabéns pela caça. Ele não conseguia aceitar o fato das crianças não poderem caçar com o resto da tribo, queria ser diferente, queria ser como os adultos. Foi dormir triste e teve um sonho bizarro no qual se tornava um macaco.
No outro dia acordou meio estranho, com a visão alterada e uma vontade louca de subir em uma árvore. Saiu pulando da oca até a árvore mais próxima, deu um salto alcançando o primeiro galho e ali ficou pendurado. Ele ainda não havia percebido, mas estava se comportando como um macaco. Só foi cair em si quando estava prestes a comer uma fruta ainda com casca.
Seus pais notaram sua ausência, passaram a lhe procurar por toda parte sem encontrar, não demorou muito para o desespero bater e toda tribo sair em sua busca. Ele começou a ouvir ruídos estranhos, parecia familiar, mas ele não conseguia decifrar o que era. Levou um susto quando seu irmão mais velho se aproximou, viu ele em cima da árvore e começou a falar com ele.
- Desça daí agora Kayapó, todos na tribo estão a sua procura - disse o irmão em tom de reprovação - desça daí logo e venha, você está parecendo mais um macaco.
O desespero bateu no pequeno índio, ele via seu irmão falar mas não conseguia compreender uma palavra sequer. Era como se eles não falassem mais a mesma língua, ele só desceu da árvore por compreender o gesto severo do irmão ordenando a sua descida. Porém tentou responder algo ao irmão e ao invés de palavras saíram da sua boa apenas ruídos sonoros muito parecidos com os de macaco. O irmão olhou para ele espantado e saiu correndo para chamar seus pais.
Kayapó foi correndo atrás do irmão, estava desesperado sem conseguir compreender nada do que acontecia. Será que o fato de ter matado o macaco teria o transformado em um macaco também? Seria uma vingança da mãe natureza para o seu ato de imprudência? Por mais que tentasse, os seus pensamentos não pareciam ter a mesma clareza que tinham antes.
Chegando na tribo o irmão foi correndo contar aos pais o acontecido e o menino agora macaco veio logo atrás. Os pais pareciam ainda mais espantados com a situação, não conseguiam compreender uma palavra sequer de Kayapó e vinham que o menino tinha os mesmos gestos de um macaco. A mãe se pôs a chorar e o pai foi correndo conversar com o pajé da tribo.
- Tacumã me ajude por favor, nosso menino Kayapó tornou-se um macaco - disse o pai em tom de desespero.
- Se acalme Ubã - disse o pajé sempre em tom sereno - diga-me o que aconteceu e eu poderei ajudar, não há nada sobre a terra que não possa ser resolvido com a ajuda da mãe natureza.
O pai contou então tudo que havia ocorrido no dia anterior, a caça escondida do filho, o desejo do pequeno de parecer diferente e a forma estranha como o filho estava se comportando. O pajé ficou intrigado com o caso, já havia escutado histórias de vingança da mãe natureza por conta de caças proibidas, mas nada parecido com aquilo. Porém como todo bom pajé manteve a calma e ordenou que o pai trouxesse o filho durante a noite para um ritual na floresta.
Assim como combinado, o pai apareceu com o filho na oca do pajé no final da tarde e os três partiram para o meio da floresta. Chegando lá encontraram uma clareira onde montaram uma pequena tenda com folhas de bananeira e o pajé preparou o espaço para o ritual. O pequeno Kayapó assistia a tudo sem entender quase nada, nunca havia participado de um ritual na floresta, isso também era privilégio para os adultos da tribo. O pajé retirou um líquido escuro de uma cumbuca e serviu para os três falando.
- Tomem esse líquido sagrado, é o vinho das almas, capaz de abrir todos os portais da mente e nos mostrar a verdade. Todo respeito é necessário quando estamos sobre o poder da ayahuasca.
Os três tomaram a bebida sagrada e o velho pajé começou a cantar um canto que aos poucos foi tomando conta da mente do pequeno Kayapó. O menino deixou-se levar pela música e sem perceber adormeceu. Acordou dentro de um sonho estranho, sabia que estava sonhando, mas tinha total controle sobre as suas ações. Um velho macaco apareceu do nada e foi logo dizendo.
- Me siga, eu tenho a cura para sua loucura - disse o macaco em tom desafiador e saiu em disparada pulando de galho em galho.
Ainda que sem entender, Kayapó seguiu sua intuição e correu atrás do velho macaco floresta a dentro. O velho macaco parecia que não ia parar, pulava de um lado para o outro e menino o seguia meio confuso. Os dois só pararam no topo da árvore mais alta, de onde dava para ver toda a floresta e tudo que estava lá embaixo. Foi então que o velho macaco disse.
- Preste bem atenção nas minhas palavras, tudo a sua volta está em equilíbrio, até mesmo o animal que come outro o faz por puro instinto natural e é isso que garante a manutenção de todas as espécies sobre essa Terra. Cada ser criado pela mãe natureza está no lugar que deveria estar e possui tudo que é necessário para evoluir. Quando você matou aquele macaco na ânsia de o comer apenas para querer ser diferente do resto da sua tribo, você provocou um desequilíbrio na mãe natureza - disse o xamã macaco em tom sério - e a natureza cobra tudo que retiram dela sem sua permissão.
- Mas e agora senhor macaco? Serei para sempre um menino macaco? Não quero, quero voltar a ser índio, como posso fazer para me redimir? - disse o menino em tom de arrependimento.
- Se eu dissesse o que deve fazer, estaria tomando o lugar da sua natureza - disse o velho macaco - você deve ouvir seu coração, ele está em sintonia com a mãe terra e saberá te levar de volta para o seu lugar.
A fala do velho macaco fez o menino acordar com um grande enjoo e ele começou a expelir um líquido verde fluorescente pela boca. O regurgito parecia não ter fim, era como se o menino estivesse expelindo todo o mal que havia feito a mãe natureza. Cansado e ao mesmo tempo aliviado, o menino deitou na tenda e só foi acordar no outro dia.
Kayapó acordou quando os primeiros raios de sol tocaram o seu rosto, não estava mais confuso como no dia anterior, era como se o ritual tivesse subido sua frequência até os céus e ele tinha agora a compreensão de tudo a sua volta. O menino deu um abraço amoroso em seu pai e outro no pajé como forma de gratidão. A sua loucura estava curada, ele não tinha mais a ânsia de ser diferente, compreendia o seu papel na tribo e nesse mundo. Passou a aceitar que tudo tinha sua hora para acontecer, cresceu em sintonia com a sua natureza e se tornou o maior pajé que a tribo Aracoara já tinha visto.

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Sonhada liberdade

Sonhada liberdade

Ponho os pés no chão
Sinto seu movimento
Gira sempre no ritmo
A firmeza do aprender

Toco as mãos na terra
Ouço seu coração bater
Na sintonia do compasso
A carícia que me faz viver

Preso a sua gravidade
Onde mora o tempo
Voa meu pensamento
Em busca de liberdade

Sei que nada levarei
Tudo que me foi dado
Será um dia devolvido
E eu enfim ascenderei

Pedro Junqueira Franco de Castro 11:07 15/09/2016

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

O bem anunciado

O bem anunciado

Na escuridão do anoitecer
Chegou sem ser anunciada
Aquela que para todos chega
Até para os que fazem o bem

Naquele amanhecer nublado
Lágrimas escorriam anunciando
Nos corações um grande vazio
Deixado pela partida do amado

Em um entardecer iluminado
Pássaros voavam anunciando
A porta do céu estava aberta
Para receber o homem de bem

A noite logo chega novamente
No peito uma saudade anunciada
Adormece sempre na esperança
Do reencontro no caminho do bem

Pedro Junqueira Franco de Castro 07/09/2016 18:52

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

O dia em que Apolo se apaixonou por Poseidon

O dia em que Apolo se apaixonou por Poseidon

Parecia um dia normal na antiga Grécia, os Deuses do Monte Olimpo mantinham a paz na terra com seus pensamentos, enquanto os humanos desenvolviam seus afazeres com dedicação. Porém uma inquietação parecia tomar conta dos pensamentos de Apolo, que havia se recuperado há pouco tempo o trágico final de relacionamento com o príncipe Jacinto da Macedônia e passava a maior parte do tempo se divertindo com seus amantes ninfos. Apolo parecia estar cansado daquela entrega carnal e começava a sentir necessidade de se apaixonar novamente. Inquieto, resolveu caminhar pelas praias dos mares Nórdicos da Europa, mais especificamente em Asgard. A companhia do mar parecia preencher o vazio deixado pelo último relacionamento, a brisa parecia amenizar a dor que sentia materializada pelas lágrimas salgadas que escorriam pelo seu rosto chegando até o mar calmo.
Apesar da pequena trégua, a dor dessa vez parecia ser persistente e quanto mais pensava na solidão, mais lagrimas caiam do seu rosto em direção ao mar e o liquido sagrado que escorria do seu rosto parecia agitar o mar. Era como se a tristeza presente nas lagrimas alterasse a vibração das moléculas da água do mar e com isso enormes ondas se formavam. Toda aquela agitação chamou a atenção de Poseidon que descansava na ilha de Atlântida e estranhou o mar daquela região ficar agitado nessa época do ano. A bordo de sua nau resolveu ir até o local ver o que causava tanta agitação a um mar tão calmo.
Chegando no local Poseidon se deparou com Apolo deitado na beira do mar, com as pontas dos pés sendo aos poucos engolidas pelas ondas e com lágrimas ainda a cair do rosto. Apolo estava tão perdido no vazio da sua solidão que nem chegou a sentir a presença de um Deus e isso chamou ainda mais a atenção de Poseidon. Como um Deus poderia sentir uma tristeza tão grande, sendo ele um dos filhos mais respeitados, admirados e adorados de Zeus? O deus dos mares foi se aproximando aos poucos e sem que Apolo notasse sentou ao seu lado na areia e começou a acariciar seus belos cachos. Apolo estava tão paralisado pela tristeza que só percebeu a caricia quando Poseidon resolveu falar:
- Diga meu sobrinho, o que pode ser tão ruim assim a ponto de deixar um dos deuses mais poderosos do Olimpo tão triste?
- Não é nada não, apenas estou apreciando a solidão do mar e esperando que ela preencha um coração vazio – disse Apolo sem conseguir esconder a vergonha no rosto e enxugando as poucas lágrimas que ainda estavam no rosto.
- Você sabe que pode confiar em mim, faria de tudo para que essa tristeza saísse do seu olhar, não gosto de ver um Deus sofrendo as dores de humanos – nesse momento o Deus dos mares se aproximou ainda mais de seu sobrinho, lhe deu um abraço e completou – Não precisa se sentir envergonhado, diga-me os motivos, quem sabe assim eles não sumam dos seus pensamentos.
Apolo se sentiu mais à vontade e começou a contar todas as intempéries do seu último relacionamento. Na medida em que extravasava aquela dor em palavras para alguém tão próximo, a tristeza parecia se dissipar e um alívio passava a tomar conta de seu peito. Poseidon escutava tudo espantado e ao mesmo tempo admirado, como um Deus pode sentir um amor tão forte por um humano? Ainda que belo e príncipe de uma região tão rica como a Macedônia, Jacinto era apenas mais um humano e não merecia lagrimas tão sinceras de um Deus como Apolo. A humildade e sinceridade de Apolo fez Poseidon sentir algo estranho pelo sobrinho, um misto de admiração e desejo de se sentir amado com a mesma intensidade que Apolo parecia amar aquele humano.
Os dois conversaram durante horas e companhia do tio fez a tristeza da solidão abandonar o peito de Apolo e no final eles se despediram com um demorado abraço e saíram dali compartilhando um sincero sorriso no rosto. Mas não demorou muito para uma inquietação tomar conta do pensamento de Apolo novamente, porém dessa vez não era por saudades do humano, o poderoso Deus sentia agora uma estranha atração e admiração pelo tio Poseidon. Aquilo o deixava ainda mais agitado, poderia aquele encontro ter despertado um sentimento que não seja fraternal por um parente tão próximo? Apolo tentou de todas as maneiras fugir daquele sentimento, mas nem mesmo os ninfos conseguiram deter aquela vontade e ele passou a visitar o tio com uma frequência cada vez mais intensa.
Poseidon gostava da companhia do sobrinho e também sentia algo especial por ele e isso o deixaria cada vez mais preocupado. Não pelo fato dele sentir uma atração tão forte por alguém do mesmo sexo, isso era normal na Grécia antiga e ele já havia se envolvido com outros humanos. Mas o que preocupava o Deus dos mares era a intensidade daquele sentimento, afinal das últimas vezes que ele havia se envolvido com homens era apenas atração carnal e nunca antes havia se apaixonado por um Deus. Fora que Apolo era seu sobrinho, isso poderia causar grande impacto no Olimpo e ainda provocar a fúria de Zeus.
Porém os encontros aconteciam cada vez com mais intensidade e o sentimento entre o tio e o sobrinho ficava a cada dia mais forte. O fato deles passarem boa parte do tempo juntos passou a chamar a atenção dos deuses do Olimpo e até mesmo os cidadãos gregos. Mas mesmo as conversas das más línguas não pareciam abalar a sintonia do sentimento que brotava entre os dois deuses.
O sentimento era sincero, não havia como negar, até mesmo um cego poderia notar a sincronia expostas pelos gestos dos dois quando estavam juntos, era como se a presença dos dois espalhasse harmonia e alegria pelo Olimpo. Porém, apesar desse forte sentimento, os dois ainda não tinham consumado esse amor, nem mesmo com um beijo e isso começava a angustiar Apolo. Ele não sabia, mas Poseidon jamais teria coragem de se entregar a um amor como esse, afinal ele era um Deus conservador e não entendia os sentimentos libertinos que regiam a vida de Apolo.
Enquanto nada acontecia Apolo seguia oscilando entre os momentos alegres passados ao lado de Poseidon e a angústia de esperar aquilo ser de fato consumado. A vida pode parecer um pesadelo diante da ansiedade de esperar por algo que temos certeza que pode acontecer e nunca acontece. E era assim todo encontro dos dois, passavam horas se divertindo e até o fazer nada parecia ser melhor quando estavam juntos. Mas assim que se despediam uma angústia passava a dominar os pensamentos de Apolo.
Essa angústia passou a atrapalhar os afazeres de Apolo e aquilo que parecia ser um sentimento bom passou a perturbar sua paz. Poseidon por sua vez se sentia confortável com a situação, pois sentia que havia conquistado a admiração do sobrinho e não sentia tanta necessidade de dar um passo à frente nesse relacionamento. O sentimento foi tomando conta de Apolo até que um dia ele não resistiu e resolveu se abrir ao tio em um desses encontros a beira do mar.
-Poseidon tem algo que preciso te falar, me faz muito bem as horas que passo ao seu lado e a nossa amizade tirou um grande vazio do meu peito- confessou o sobrinho meio sem jeito- mas algo estranho tem acontecido, sempre depois que vou embora me bate uma angústia. É como se algo muito bom fosse acontecer a qualquer momento e esse algo nunca acontece.
-Querido Apolo, eu não sei muito o que te dizer – disse o tio ainda mais sem jeito- carrego comigo um sentimento muito especial por ti e desejo muito sua felicidade.
-Não precisa me dizer nada, apenas te disse isso pois me sufocava e precisava ser sincero. Eu também te quero muito feliz - nessa hora Apolo hesitou um pouco, queria muito dizer que se Poseidon se permitisse poderiam viver uma das histórias mais lindas de amor, mas teve medo de assustar e se distanciar do tio- e sinto que você deseja o meu bem.
-Espero que compreenda que apesar de ter esse sentimento tão sincero por ti, não seria capaz de enfrentar tudo e todos para levar isso a frente. Prefiro ser somente um amigo e não alimentar falsas esperanças, compreendo e admiro sua coragem e liberdade, mas tenho uma maneira diferente de ver a vida.
Os dois deram um abraço demorado, apesar de toda sinceridade e intensidade do abraço, havia nele um certo ar de despedida. Por Poseidon eles permaneceriam com aquela amizade, para ele já bastava a companhia do sobrinho, mas Apolo por mais que tentasse não conseguia controlar aquele sentimento. Diante da angustia preferiu se afastar aos poucos, precisava esquecer o tio para enfim se ver livre e poder amar novamente.
Não foi tarefa fácil para Apolo se livrar da dor de mais uma separação amorosa, ele não conseguia entender os motivos de não encontrar seu grande amor, tinha um sentimento muito profundo de companheirismo que precisava ser alimentado por alguém. A solidão parecia não bastar, ele queria dividir momentos de alegria, cuidar de alguém por quem tivesse um sentimento especial e tinha a necessidade de ser importante na vida de alguém. Ele sempre se perguntava, como poderia um Deus sentir um vazio tão grande no peito? Ele era um Deus, deveria se bastar.
Apolo resolveu voltar onde tudo aquilo havia começado, passou a tarde na praia olhando o mar, com a cabeça cheia de lembranças de amores passados e a angústia por respostas. Começou um choro repentino, que foi se intensificando até o anoitecer, aos poucos as lágrimas iam caindo e se perdiam na imensidão do mar. A noite chegou e Apolo dormiu ali mesmo, com lágrimas ainda escorrendo dos olhos e um vazio no peito. Durante a noite teve sonhos intensos com lembranças das coisas boas que havia feito para os outros na ânsia de encontrar seu grande amor.
Acordou no outro dia com o nascer do sol, sentiu a brisa leve tocar o seu rosto, o calor do sol aquecer sua pele e respirou um ar que parecia tão puro que preencheu completamente seus pulmões fazendo diminuir sua densidade e ele se sentir mais leve. As lágrimas pareciam ter ajudado a enterrar seus castelos junto com a areia da praia. Ele acordara apenas com as lembranças boas dos amores perdidos e um sincero sentimento de plenitude. Era como se da noite para o dia ele estivesse curado de toda dor e passasse a compreender que apenas o fato de existir já lhe bastava.
A partir daquele dia Apolo passou a ver a vida de uma maneira diferente, havia leveza e harmonia no seu caminhar, o vazio do seu peito era preenchido pelas pequenas coisas que gostava de fazer, como caminhar pela praia, comer uma fruta saborosa direto do pé, passar horas se divertindo com os amigos e cuidando daqueles que amava. Aquele amanhecer na praia lhe fez se sentir completo por fazer parte do todo. Ele chegara a compreensão que nunca esteve sozinho e o mundo era sua companhia para toda vida.
Apolo continuou espelhando sua luz pela eternidade, viveu grandes amores depois daquele, sempre sem se esquecer que amores vem e vão e o que permanece são os momentos compartilhados com alegria. Você nunca irá encontrar um único amor na sua vida, mas sim pessoas com quem vai dividir grandes momentos e tirar importantes lições. Afinal Apelo havia aprendido a maior de todas as lições: viemos para o mundo sozinhos e partiremos sozinhos, mas temos olhos para aprender a ver o próximo, ouvidos para escutar com afeto, olfato que nos permite perceber o aroma que exala das nossas atitudes, tato para tocar o coração com as mãos e paladar para aprender a saborear cada momento. Aquele Deus havia aprendido a lição mais divina, antes de procurar no outro a divindade que há em cada ser é preciso saber reconhecer e amar o lado divino que há dentro de sua própria vida.

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Aracoara

Aracoara
Brotam dos sonhos
Dessa sua gente
Todos os mistérios
Da sábia serpente

És luminosa fonte
Na tarde alaranjada
Com aroma cítrico
Uma bola dourada

Sua chama xamã
Ilumina a floresta
Floresce no filho
Luz da nova era

Hoje em seus trilhos
Só passa a saudade
Lá de cima do balão
És uma nova cidade

Não vim dessa terra
Mas dela me tornei
O sol que brota nela
Em mim morada fez

Pedro Junqueira Franco de Castro 22/08/2014